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Calendário de uma decisão 

Familiares e pessoas com deficiência esperam por mais iniciativas

Novembro 2020

Marina Miano Cardoso. 

A Associação Mantenedora de Mães Especiais (AMME), uma Instituição sem fins lucrativos que atende pessoas com deficiências desde 1998, há 22 anos, no município de Osasco e presta auxílio a 120 famílias. Até o ano de 2018, tinha um convênio na Secretaria de Assistência Social, mas com as mudanças de normativas, acabou perdendo. Porém, por prestar um serviço importante, foi convidada a se credenciar na Secretaria de Saúde para realizar o projeto CER II (Centro Especializado de Reabilitação nível II).

 

A criação da AMME veio da necessidade da presidente Vera Aparecida Silveira de Camargo que tem um filho especial e precisava de um local apropriado para atendê-lo, já que escolas públicas e algumas particulares não são preparadas para receber crianças com deficiência. A instituição tem como missão acolher essas pessoas, oferecer oficinas de atividades e outras metodologias sócio educativas, atendimento às famílias para incentivar a buscar a garantia de seus direito sociais e para que os cuidadores (pais) possam trabalhar. “É praticamente uma creche que atende pessoas com deficiência em período integral, entram às 7 horas e saem às 17h. Lá, se tem as refeições, as atividades que são realizadas e etc.”, informou uma fonte que preferiu não se identificar. Contudo, essas atividades eram realizadas algumas vezes de forma precária “que acabavam não desenvolvendo tanto a capacidade cognitiva e motora. Estamos modificando isso para que se tenha sessões mais terapêuticas com fisioterapeuta, terapeuta ocupacional e  médicos de várias especialidades que vão passar a atender na AMME. O que estamos fazendo é implantar um serviço público de saúde do SUS que vai ser executado. Por exemplo, uma pessoa que passa por esse quadro clínico de deficiência física, intelectual e  autismo, passa na Unidade Básica de Saúde e aí vai ter um encaminhamento para fazer um processo terapêutico e ser avaliado pelos médicos especialistas da AMME”, diz o secretário da SEPLAG (Secretaria de Planejamento e Gestão), Bruno Mancini. 

 

Por não depender de recursos públicos fecha todo ano com muita dificuldade, pois se mantém de doações, os pais que têm condições colaboram e os eventos que realiza como festa junina; dia das crianças; festa de fim de ano e o projeto: Adote um aluno AMME. Com isso consegue arrecadar alguns fundos e sanar os gastos. O convênio que tinha na Secretaria de Assistência Social era responsável pela contratação de funcionários CLT, mas não arcava com os tributos da folha de pagamento como o INSS, 13° salário e verbas rescisórias, tudo isso era responsabilidade da Instituição. O transporte de alguns alunos é realizado pelos carros da Prefeitura, os cadeirantes fazem parte do “Servindo” que conta com peruas preparadas para transportá-los e é de responsabilidade da Secretaria de Educação. 

 

Até a gestão do Prefeito Lapas o convênio era renovado, com alguns atrasos, mas o compromisso era honrado. Na atual gestão não se conseguiu mais efetivar, houve diversas solicitações junto ao Prefeito. “Em 2018, tivemos a notícia de que AMME estava fora da Assistência Social”, relata a fonte que não quis se identificar. Por conta das mudanças das normativas e a avaliação da equipe técnica se observou que o serviço que a AMME presta não era um trabalho tipificado na Assistência Social no Brasil, a política para  pessoas com deficiência ainda tem diversos problemas de organização no ponto de vista institucional. “A Assistência Social tem dois grandes blocos: a Proteção Social Básica e a Proteção Social Especial. O primeiro é para trabalhar o serviço de convivência comunitária e familiar; o segundo se trata da violação de direitos graves como casos de violência, medidas sócio protetivas para crianças e adolescentes que precisam ser retirados de suas famílias por conta de vários contextos e vão para adoção, os serviços de acolhimento e os casos de violência contra as mulheres.” relata Bruno Mancini. 

 

“Como ela faz um trabalho muito relevante para a cidade de Osasco e já tinha no planejamento se estabelecer um serviço específico de reabilitação na zona norte, similar ao que se tem na zona sul a EMEE Dr. Edmundo Campanhã Burjato. Apoiamos a AMME para se credenciar como um serviço de saúde, porque o trabalho terapêutico se faz é significativo no processo de desenvolvimento da pessoa com deficiência que a AMME atende. O convênio funciona diferente dos demais serviços prestados pela Prefeitura, porque a gente paga adiantado. Então repassamos o dinheiro para as instituições, elas executam o plano de trabalho e prestam contas”, relata o Secretário da SEPLAG. Foi solicitado a realização do projeto CER II e assim foi feito, depois de algumas devolutivas para que alguns ajustes fossem realizados, em novembro de 2019, após a demora da implementação do Centro Especializado de Reabilitação nível II as mães se organizaram para fazer um protesto em frente a Prefeitura e desse modo o convênio foi assinado. “O Prefeito foi até a instituição assinou publicamente com as mães presentes, a diretora e coordenadora da instituição” diz Rosana Rosa Pereira, bancária e uma das mães que participa da AMME. 

 

Novamente não se realizou muita coisa após isso, apenas a instituição foi fechada para reforma e, para justificar a demora, era alegada “falta de documentação”, mas todo o checklist de documentos foi apresentado, junto com a cotação de item por item como seringas, agulhas, remédios de boca, etc. “No dia 27 de outubro,  os pais fariam uma atividade na porta da Prefeitura para dizer ao Prefeito que se está faltando um documento, qual é?”, relata Rosana. Então, na sexta-feira (23/10) a diretora e coordenadora foram chamadas para ir assinar os papéis junto com um representante da Secretaria da Saúde. 

 

Uma parte (da demora) é por conta da própria natureza da AMME que fazia esse trabalho tipificado no Serviço de Saúde. Estamos trabalhando em conjunto para elaborar os planos de trabalho, para poder apoiá-los nesse projeto que estamos definindo. A AMME passou por alguns problemas financeiros graves e perdeu parte da sua equipe e no meio disso tudo houve a pandemia, tivemos que voltar todos os esforços na área da saúde para o combate ao coronavírus. Agora que está numa situação um pouco mais flexível e com condições de avançar nesse projeto, que estamos retomando faz uns 45 dias mais ou menos. Montamos uma força tarefa para conseguir viabilizar a sua conclusão, existem algumas questões arquitetônicas do espaço que precisam ser remodeladas, a questão de perfil técnico dos profissionais que irão trabalhar e também uma mudança de cultura em relação aos atendimentos. Portanto, é um processo difícil de remodelar, fizemos um trabalho de atualização do diagnóstico de cada pessoa que a AMME atende no ano passado. No dia 23, conseguimos finalizar o parecer técnico da saúde a respeito do projeto. A equipe da saúde mental precisava avaliar o plano de trabalho para ver se era exequível no ponto de vista da rede de saúde mental. Nesses últimos dias estamos resolvendo algumas questões mais documentais e orçamentárias. Estamos trabalhando muito para conseguir fazer isso brevemente, um dos impedimentos, que foi a questão orçamentária, conseguimos resolver para conseguir garantir os recursos nos próximos meses em que terminam as obras para assim começar a recrutar as equipes que vão fazer os atendimentos. Achamos que no começo de dezembro o convênio já vai estar assinado e com autorização para começar a executar o plano de trabalho”, explica Mancini. Também foi dito que na segunda-feira (26/10) seria publicado no IOMO (Imprensa Oficial do Município de Osasco), mas isso também não foi feito. “O processo vai passar pela reserva orçamentária, depois vai para um parecer jurídico a respeito da celebração do convênio, depois de assinado é publicado no IOMO. Isso deve acontecer na próxima semana mais ou menos, dependendo da parte documental, às vezes atrasa um pouco”, diz Bruno Mancini.

 

“No último dia 27, eu estaria em frente a Prefeitura. Não teve porque houve uma reunião e foi feito um novo combinado. Estamos acreditando que seja real, mas se não cumprir, com certeza, vamos para a Prefeitura”, relata Elis Regina mãe que faz parte da AMME e trabalhava com Inspetora. Em 04 de novembro, os pais marcaram de realizar outro protesto na porta da Prefeitura, seria feito no dia 09/11, porém na sexta-feira (06/11), novamente, a Vera Aparecida Silveira de Camargo, presidente da AMME, foi chamada pelo Prefeito que disse que até a próxima semana assina o restante dos papéis. Até a finalização desta matéria não houve publicação oficial. 

 

Esse desconforto, uma sensação com muitas camadas, um incômodo que sentimos quando confrontados com a desigualdade é o que move esses pais. “Costumo dizer que a Thaís é uma extensão de mim, porque se eu não der banho ela não toma, se não der comida ela não come, se não trocar a fralda, ela fica suja o dia inteiro. É capaz dela morrer dentro de casa em cima de uma cadeira de rodas sem ninguém cuidar dela. Ela é completamente dependente, mas não é invisível, ela é a minha filha. O município, os políticos, as pessoas que estão ao nosso entorno não entendem que a gente precisa de apoio, precisa de estrutura. Quando nós os pais damos esse grito não é apenas nosso, é de uma comunidade que não é visto”, conta Rosa Pereira.

 

O choque é perceber que está diante de um outro ser humano, assim como você, mas que é tratado de um jeito bem diferente. “No começo foi complicado para saber o diagnóstico do Gustavo, mesmo no convênio médico que tinha na época, não consegui um parecer médico. Só consegui o diagnóstico de autismo dele na Clínicas. Até então você sabe que tem um filho que com 1 ano não era verbal, só falava quando achava que era necessário e frases repetitivas. Só consegui saber que ele é autista  e tem atraso mental aos 7 anos. Quando eu perdi o meu marido me vi sozinha com um filho autista, uma filha menor de idade e toda a responsabilidade de gerir uma casa.” relata Elis Regina. Se algo te incomoda constantemente você enlouquece, então uma saída é naturalizar o seu olhar para aquilo. Ou você resolve aquele problema, e isso te mobiliza, ou você vai se neutralizando e com isso a sociedade passa a ter um conjunto de pessoas invisíveis do ponto de vista moral.  

 

“A AMME surgiu da necessidade. Antes consegui uma escola na Brooklin a Evolução, até fui questionada de o porquê levar o meu filho para tão longe de Osasco. Eu precisava fazer isso para ele sair de casa e começar a interagir com outras pessoas, e também pela recente perda do pai. Ele ficou na Evolução durante um ano e depois foi para outra Instituição a Bem Me Quer, onde ele ficou também por um ano.Depois fiquei sabendo da AMME e transferi ele. Nós pais precisamos do apoio da atual gestão, a Instituição precisa continuar e que se tenha o convênio para realizar o que foi prometido: o psiquiatra, psicólogo, todo o trabalho que é necessário para eles (as pessoas que a AMME atende). Porque se os governantes e nós pais não fizermos nada por eles, ninguém vai fazer, eles dependem dos outros”, diz Elis.  

 

Feche os olhos e pense em como gostaria de ser tratado se fosse uma pessoa com deficiência. “Esse desdobramento, a falta de empatia com a gente fez com que a AMME fechasse para reforma, esperando que o centro fosse acontecer, muita gente ficou fora da Instituição, meses antes da pandemia. O Prefeito precisa saber que ficamos esperando por isso, e não é um favor que ele faz é um direito, nós também pagamos impostos. As pessoas com deficiência têm os mesmos direito que as normais a saúde, educação, à transporte”, comenta Rosana. “O autista, os que têm síndrome de down e outros deficientes merecem uma atenção e respeito de toda a sociedade”, finaliza Elis.

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